O Senhor tem um minuto pra dizer a razão pela qual quer ser mais uma vez
reconduzido.
Ah, porque agora tenho que pagar a toxina botulínica da patroa. Sem
falar que quero continuar bebendo o scotch 18 anos, a libar um autêntico bordeaux,
engordar a conta bancária, upgradear o patrimônio, fazer minhas viagens e
ajudar os amigos, porque, afinal de contas, vivemos numa sociedade pós-moderna, ou seja, solidária e
fraterna, não é mesmo?
E quanto ao povo, não vai dizer nada?
Que polvo? Prefiro camarão ao alho e óleo.
Não me referi ao molusco. Falo do zé-povinho, nenhuma palavra pra ele? Isso
não é um teste, estamos ao vivo, numa coletiva, o seu microfone está aberto.
Ah, claro (tentando disfarçar a surpresa, ao mesmo tempo em que ajeita o
nó da gravata), como poderia esquecer o polvo, melhor dizendo, o povo...
Nesta altura, demonstrando visível desconforto, vira-se para trás (a
câmara o acompanha) e localiza o assessor. E então, em linguagem labial,
pergunta: o que é que eu digo?
O assessor, solícito, na mesma linguagem, dispara: diz aquela!
Qual? Aquela que todos
repetem?
Exatamente, aquela frase feita de todos conhecida. É imbatível.
Mas está tão desgastada. (Em verdade, ele queria dizer manjada). Quero falar algo novo, original, impactante,
republicano.
Não importa, ninguém vai lembrar mesmo. Nunca ouviu falar em memória
curta? Vai soar como se fosse dita pela primeira vez. Bem contemporânea.
Recomposto, encarou a câmara mais próxima e, num tom pra lá de solene, disse:
Desconsiderem o que eu falei antes, pois, evidentemente, tudo não passou
de uma brincadeira, pra relaxar. Podem ficar tranquilos. E isso não é promessa,
é um compromisso registrado em cartório. Sei que ninguém aguenta mais ouvir falar em potencialidades. Por isso, agora é
pra valer. Nossa hora chegou. Não medirei esforços. Vou lutar por mais investimentos
pra nossa região e com isso gerar emprego e renda para a população mais
carente.
Pano rápido.
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