domingo, 18 de novembro de 2012

PÔR D0 SOL

Aquele que ali vem não é Jomar, apesar do andar estabanado do Jomar. Esse, que aí vai, é quase um clone do Rudá e seus passos miúdos e ligeiros. Esta que logo se torna uma estranha bem que podia ser Sara, amor da minha longa vida jamais realizado num único beijo sequer, mas não é a Sara, a mais bela das desdenhosas do nosso tempo. Por que o tal médico dela o escolhido? Ainda hoje desatino a razão da extremada sorte dele, que o cu voltado pra lua nunca tive. De longe, se apurar bem a velha vista, vejo Homero, apressado rumo ao jornal onde diariamente não dava trégua aos corruptos, mesmo sempre derrotado. E aquela acolá...

Bem, uma vez por semana me trazem do abrigo de anciãos até aqui e ali, num banco da igreja do Amparo a custo me ajoelham, e rezo. Ele, porém, a súplica há muito não me atende e vou ficando aqui quando todos os que amo e odeio já lá, aquietados, no outro lado do mistério, estão. Que pecado tão capital cometi nessa quase centúria? Não, minhas faltas não têm esse valor, que nunca passaram elas de erros que só a mim prejudicaram, como quando joguei tudo pro ar para correr atrás de um rabo de saia que logo se esvaiu, coisas de que essas doenças que me torturam já são juros mais que suficientes acrescidos ao pagamento que, por uns trinta anos, já efetuo. Então, por que não me atende Ele o pedido? Por que não me pode a Noite sobre mim, enfim, descer? Até meus desaparecidos inimigos, uns dois ou três mais empedernidos, até eles decerto concordariam que fazer cem anos é sacrifício que, como dizem no tempo de agora, ninguém merece...       

EU VI YO VEO

Eu vi um ministro de estado decir que o objetivo é mandar aquele povo de volta ao medievo.
Eu vi que um dos cavaleiros (aquele do caballo cheio de musgo e que atende pelo nome de intolerância) tremulava o estandarte negro e de sua boca, enquanto falava, escorria o sangue do inocente.
Eu vi as sapatas e as lagartas avançarem sem peias sobre la ciudad del hombres desterrados e não era nenhum sentimento do tipo isso eu já vi antes.
Eu vi que a guerra y el fuego são o alimento do homem e ele não tem fim.
Eu vi um andarilho no meio da carretera no meio da noche olhava para o firmamento e contava tantas estrelas quanto sua memória suportava e não compreendia porque algumas delas mudavam de lugar.
Eu vi um bardo manco desconstruindo versos que acabara de tecer para depois canibalizar um a um como quem pide perdón pelo que podia ter sido e não foi.
Yo vi un meteoro fumegante tingindo o céu de cinza e por um momento me lembrei da estrela cadente da minha memória de menino.
Eu vi um gato negro ele cruzou a calle ele se escondeu no beco ele seus olhos confiou a mim eles queimaram-me as mãos.
Eu vi um cão pestilento de ojo azul arrastando sua pata traseira sem forças para ganir e nesse momento eu pensei talvez seja a hora de estocar comida.
Eu vi una virgen de pelo largo riscando o chão com uma varinha de condão e eu disse nessa jangada de pedra eu também quero um lugar.
Eu vi um homem se alimentando da própria hambre.
Eu vi num cruzamento qualquer entre duas ruas ninos engolindo bolas de fogo e fumaça.
Eu vi meninas de rostos sujos de olhos fundos exibindo rosas desfolhadas antes da primavera de mayo.
Eu vi una mujer com o ventre vazio e um menino não nascido entre caixas e papelões.
Eu vi la lumbre lucir  enquanto la luna  se escondia no oriente.
Eu vi o acontecer o descortinar o tecido se formando a teia se erguendo o ovo da serpente o amor sem pecado,  pero cuando abri os olhos eu já estava muerto.
Esas y otras cosas yo vi,
mas, eu, asi como nosotros, nada hice.
Eu também não vi el otro.
Eu também não lancei um olhar porvenir.
Solamente vi.
Unas cuantas eu deixei de ver, acho que de propósito.
Aquellas eu escondi.
Otras yo sé que nunca.