sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

O HOMEM DA SEGUNDA - FEIRA


Conto rabiscado na praia do Farol da Barra, Salvador,Bahia.

Cornélio Carnaval augurava relações e segredos. Os instantes pareciam ter o peso da experiência e hábitos de um comportamento austero.
Antes ele olhava Mariana Parente, os olhos atrevidos pela blusa vermelha.
- O que você imagina?
- Não devo revelar.
Aproximou-se dela, fez um carinho com o dedo na mexa loura que pendia da orelha. Mariana Parente sorria com os olhos como se esperasse outro lance.
Ela sorriu com hálito de dentefrício e por um triz não insi­nuou a cor de sua langerie sob a saia estampada de azul e preto.
Cornélio Carnaval, de gestos sutis, procurava deixá-la solícita e de olhos evidentemente alegres.
Mariana Parente lembrava "uma cavalgada ávida e silenciosa no meio da noite". "Minha loura, gostei", ela pensava de foro contumaz.
Cornélio Carnaval insinuou num súbito sorriso "você gostou, meu bem?”. "Não posso dizer", Mariana Parente asseverou.
"Você gostou mesmo do meu umbiguinho, meu bem?
"Você notou que eu fungava quando acariciava.
"Não quero lembrar, disse Mariana aununcíando sor­riso.
Cornélio Carnaval avidamente colhia os instantes medindo as palavras, os olhos, o silencio. Ela parecia gestualizar-se en­tre o quero mais ou o solícito talvez.
Cornélio Carnaval pensava sutilmente no que Mariana Parente pudesse insinuar ou revelar.
Ele lembrava que ela se mostrava sensível a carinhos no pesco­ço. Ele ria de olhar querendo puxar as lembranças. Mariana Parente mexia intencionalmente com as pernas em movimentos aparentemente compulsivos.
"Não me olhe assim, não quero que veja.
"Sigo seu olhar, brilho e ansiedade, disse ele.
"Você acha mesmo?
Mariana Parente ergueu-se da cadeira como se o "arrastasse” de­liberadamente com os olhos.
Ela ergueu metade da blusa vermelha.
"Não vai me seguir?
"Evidentemente, que sim, meu bem.
Mariana Parente deixava se levar pelo instante, "nos fatigávamos e ele me chamava de minha loura", ela pensou, entre ávida e compungida.
Diante dele Mariana Parente insinuava livre e nem um rastro de" interdição. "Desse geito que ficamos acho que podemos. Mereço mesmo o que se passa conosco. Ele assentiu discreto. Os olhares amantes revelavam entre o desejo, a ansiedade e a discrição.
Olhe minha blusinha, não o estimula?
Apenas você, meu bem, disse Cornélio Carnaval dividindo a atenção dela com o trãnsito na avenida Frei Serafim.
O relógio do carro me levava ao escritório, o trabalho, o métode o rigor. Mariana Parente me olhava sorrindo. No pescoço o fino cordão em ouro, o cisne branco.
À medida em que distância diminuia da íntima presença, Cornélio Carnaval subitamentce inseria no objetivo o sentido do trabalho.
- Mariana Parente o trabalho me chama.
-Conheço isso, meu bem, disse ela.
-Trabalho, trabalho, depois o pleisir, ma bien.
-Conheço a lógica trabalho e prémio, ela disso sorrindo.
Escritório, cálculo matemático, fichas de trabalho uma ordem aparente, e ao fixar-lhe os olhos, as pernas brancas, a langerie preta, Mariana Parente uma ordem sutil e aparente.
Diante de Cornélio Carnaval ela instante abria arregalado os olhos, como se dissesse "não faça isso” ou apenas fechava os olhos, o cisne branco, calma et plaisir.
Cornélio Carnaval diante do fremir fungoso “meu amor, mi amore.” Mariana Parente deixava-se encaixar na exata medida, dimen­são concreta e abrupta do prazer.
"O que você achou, ma bien? Perguntou ele.
"The love is beutiful, my darling, disse ela pastichando a voz.
Agora que a ciência sabe que a terra está parada e o mundo é azul, quero calma, repouso e uma boa dose de carinho, disse Mariana Parente espreguiçando-se entre lençóis.
Cornélio Carnaval apenas esboçou um gesto solícito como se expressasse “foi bom, ma beute, faça paz, não faça guerra”.
A tarde caía ao toque sutil da vaga expressão "luxe, calma et plaisir.
Mas o dia seguinte se anunciava com o traço da segunda-feira, evidentemente o trabalho, rigor e tambem prazer.
Bezerra JP – Escritor e Cientista

domingo, 13 de fevereiro de 2011

TUCO

A natureza não foi generosa. Mas a ele deu ouvidos atentos que, à distância, ajudavam-no a distinguir os diferentes sibilos da serpente. Com os olhos, sempre piscando e girando de um lado a outro, à frente, movimentava-se em silêncio. Fez-se intimo do calor do deserto, provou do veneno do escorpião, e sobreviveu. A dignidade, esta se foi cedo. Do pai, nunca soube. Da mãe, não se recorda do dia em que a viu sóbria. Mas nada disso importa agora. A vida cuidou de fechar-lhe o coração, deixando-o duro como uma rocha. Não fosse pelo ar de desamparo que, quando descuidado, denunciava o sofrimento e a amargura, não seria arriscado dizer que nunca perdia o bom humor. Alguma dor que não tivesse experimentado? Não. Por isso, viver com a corda no pescoço fazia parte do jogo, mesmo quando não havia um anjo louro à retaguarda.