A viagem se fazia noites e dias.
- “Esta noite nunca mais”, balbuciou Serafim Vitalino.
- Ora, homem deixa de remorsos, disse Dora.
- Para lá de Currais de Pedra, apegados à Paraibuna.
- Bem pensado, é hora de chegar, engoliu o riso.
A distância parecia ter espelhos, a memória. Serafim Vitalino ouvia um assovio, melodia do luar do sertão na noite escura.
Escaramuças na caatinga, os cabras do Coronel José Pereira vingando a marca, o ultraje no retrato do pai, nos destroços da casa de fazenda.
“Meu pai, ultraje vingado”, falou o coronel por trás de anos
- Dona Maria e o seu ancestral paraibano, insinuou Dora.
- Deixa estar, memória.
A caatinga, o cangaço e os caminhos do sertão se abriam, mascaravam silêncio e travessia.
Dora ergue-se de seu silencio como se sorvesse irresoluto segredo. As marcas, o sangue, a travessia.
Serafim fluía em palavras que pareciam sair de anos.
- Durma, Serafim, disse Dora, ninando o seu sono. Homem barbado e feito.
Dora se deixava cair no sono, à deriva das horas e das lembranças.
- A caminho de Paraíbuna, prolatou a voz do pai.
- Seu Beno, homem de capricho. Dora parecia ler segredos da família.
- Escaramuças na caatinga, todo cuidado é pouco, meu filho.
- A caminho de Paraíbuna ouvia-se o clamor de olhos estios, anos sem conta.
Como se os dias parissem a memória. Estrada, a cidade e a pouca ruas. Casas de portas e janelas deslizando diante dos olhos telúricos, ávidos, curtidos de estradas e espera.
Serafim Vitalino e Dora dialogavam, às vezes silêncio, outra vezes poucas palavras. O tempo se entrelaçava às vidas e sinas na esteira de anos e sertões.
- É hora de chegar, murmurou Serafim Vitalino, os olhos miravam a tarde caindo.
- É hora, Dora deixou o murmúrio insolente, que parecia vir da avó, e o silencio rondava a noite.
Paraibuna uma miragem se escondia no cansaço. Serafim Vitalino colhia o ânimo nas falas, nas lembranças. A casa de fazenda, o curral, vaqueiros.
- Campeadores de sonhos dissimularam Dora.
- Campeadores de lembranças, idas e vindas do coronel à capital.
- Afrontas pondo fogo nas casas de inimigos.
Serafim Vitalino esperançava Paraibuna na memória, o sertão fujento, o olhar ávido e seco como o couro nos móveis esquecidos, flagelo, travessia.
De repente a madrugada e Paraibuna aos seus pés.
- Hora de chegar, Dora.
- Cavalgaremos nossas lembranças, Serafim.
- “Esta noite nunca mais”, ouvi de meu pai na rede de tucum , no alpendre. Estava cansado de campear lembranças.
Ao sol do dia a Paraibuna, a fazenda, o moinho, cenas perdidas no tempo. Pedaços de sertão, morros, caatingas se fundiam no horizonte. Agora que dúvidas tinham dessa paisagem que se exauria com rugir do tempo.
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